Os especialistas acreditam que sim, mas é preciso fazê-lo com muito critério e cautela, porque apesar das injecções de liquidez do BCE, a incerteza ainda impera nos mercados.
Há alguns anos que o urso, símbolo de um período longo de quedas nas acções, impera no mercado. Mas há quem acredite que, depois de um 2011 para esquecer, o urso esteja a dar sinais de que vai hibernar. Na verdade, olhando para a ‘performance' dos principais índices accionistas, desde o início do ano que os desempenhos têm sido particularmente optimistas, com índices, como o alemão DAX, a valorizar perto de 14% em 2012. Uma análise recente do Diário Económico mostrava mesmo que está a ser o melhor arranque de ano para as praças europeias desde 1998, enquanto que no outro lado do Atlântico as acções americanas estão a protagonizar o melhor início de ano desde 1989. Perante o regresso do clima de euforia aos mercados, o Diário Económico falou com alguns especialistas para perceber se a "idade do gelo" nas acções está finalmente prestes a terminar e se esta é (ou não) uma boa altura para os investidores regressarem às acções.
Alexandre Sousa, especialista em análise técnica, está confiante sobre o rumo das acções. "Estamos perante um ‘rally' sustentado e previsto dos mercados, mas ainda é cedo para afirmar que não é apenas uma recuperação técnica". O analista acredita, por isso, que este é um bom momento de entrada nesta classe de activos mas "apenas para investidores experientes e atentos, já que o risco ainda é grande, e de forma selectiva evitando para já activos mais voláteis".
Também Nuno Serafim, director-geral da IG Markets em Portugal acredita que este é um bom momento para os investidores de longo prazo começarem a construir posições no mercado accionista, ainda que de forma cautelosa. "Tendo em conta as taxas de juro reais negativas implícitas nos investimentos de baixo risco e considerando que a Zona Euro vai conseguir conter os efeitos do incumprimento da Grécia, situação que ainda não pode ser posta de parte, pensamos que faz sentido numa lógica de longo prazo aumentar gradualmente a exposição ao risco". Até porque, para o especialista da IG Markets, apesar das subidas exuberantes nas últimas semanas as avaliações mantêm-se atractivas e, no seu entender, "é plausível ainda haver espaço de subidas significativas". Mas apesar desta visão optimista, tal não significa que os riscos do passado estejam completamente desvanecidos. Pelo contrário, Nuno Serafim alerta para a possibilidade de haver uma correcção no curto prazo, dada a permanência de algumas incertezas, sobretudo ao nível da situação da Grécia e da resolução da crise da dívida soberana. "No curto prazo, é muito provável uma consolidação técnica até porque continuamos a ter alguns riscos, nomeadamente a aprovação do segundo pacote à Grécia pelos Parlamentos nacionais, uma questão especialmente sensível na Alemanha, Holanda, Finlândia e Áustria, e as eleições na Grécia, em Abril, e em França, em Maio", explica o especialista.
Na verdade, o impasse em torno da situação problemática das finanças públicas gregas e a possibilidade latente do país helénico sair da Zona Euro tem condicionado o comportamento dos mercados de dívida e de acções. O facto dos governantes locais e das entidades externas terem finalmente chegado a um acordo para o estabelecimento de mais medidas de austeridade- que funcionam como uma moeda de troca para que a Grécia possa receber um segundo pacote de ajuda (no valor de 130 mil milhões de euros)- é um dos factores que tem contribuído para um maior optimismo dos investidores. E embora a situação seja extremamente frágil, muitos anseiam que este seja um primeiro passo para ver a luz ao fundo do túnel.
Mas o grande factor que está a puxar pelas bolsas europeias desde o início do ano é outro: as injecções de liquidez do BCE no sistema financeiro. Recorde-se que, em Dezembro, a entidade liderada por Mário Draghi colocou no mercado uma operação de refinanciamento de longo prazo (LTRO), onde disponibilizou uma linha de 490 mil milhões de euros aos bancos europeus para um prazo de três anos. Já no final deste mês, o BCE deverá fazer uma outra operação semelhante. Estas medidas do BCE pretendem colmatar os problemas de acesso a liquidez que a banca europeia enfrenta e fomentaram a confiança dos investidores.
Apesar desta melhoria de sentimento, a prudência parece ser a palavra-chave a ter em conta neste momento. Esta é a opinião de Tiago Ribeiro Pereira, gestor de activos do banco Carregosa. "O início de ano está a ser globalmente positivo mas o mercado está a mover-se pelas notícias e não pelos fundamentais das empresas. Há uma grande volatilidade que se calhar é a nova normalidade. Pode ser um bom momento de entrada nas acções mas numa lógica de ‘stock picking', porque há algumas boas oportunidades". Para o gestor do Carregosa os títulos do sector financeiro estão entre os mais atractivos. "Acredito que, provavelmente estas acções já tiveram um desconto muito grande, a maior limpeza nos balanços já foi feita e que daqui em diante a situação não piorará e até pode melhorar", refere o especialista, que recomenda para os investidores com um perfil de risco mais baixo a aposta em acções de empresas não cíclicas. "Durante vários anos estas empresas pagaram bons dividendos, caso por exemplo de algumas acções ligadas ao sector farmacêutico e à indústria do luxo", refere Tiago Ribeiro Pereira. Já Nuno Serafim da IGMarkets aconselha aos investidores de longo prazo o investimento em empresas internacionalizadas, "de preferência com exposição a mercados emergentes, líderes sectoriais e empresas com funding assegurado".
Se está a pensar em regressar às acções, o Diário Económico dá-lhe a conhecer as cinco acções europeias do Eurostoxx50 que reúnem a preferência dos analistas e os cinco títulos do Dow Jones com melhores perspectivas das casas de investimento para os EUA. Da lista fazem parte gigantes como a Coca-Cola, a JPMorgan ou a empresa de luxo Louis Vuitton.
Visão mais cautelosa para a bolsa portuguesa
Nem todas as acções merecem a mesma visão positiva e optimista. O facto de Portugal estar a viver uma situação atípica, condicionada pelo resgate de autoridades internacionais, leva os especialistas a olhar de forma particular para as acções portuguesas.E aqui as opiniões são menos efusivas do que para os restantes mercados europeus e americanos. Nuno Serafim, director da IG Markets para Península Ibérica refere que a "perspectiva para o mercado português é ainda negativa. Para este ano esperamos um clima extremamente recessivo pelo que todas as empresas muito expostas ao mercado nacional têm um cariz puramente especulativo". Ainda assim, salienta a preferência por empresas com exposição a outros mercados, como é o caso de Portucel, Semapa, Galp e Portugal Telecom.
Já do ponto de vista técnico, Alexandre Sousa também mostra alguma cautela. "O mercado accionista nacional tem apresentado nas últimas semanas diversas sessões animadoras. Contudo, tecnicamente, o cenário é menos eufórico e aconselho mesmo alguma prudência. Pela positiva destaco o corte das linhas de tendência descendentes de médio e curto prazo e o corte, ainda não conclusivo, da resistência dos 5.700 pontos". E explica que, no curto prazo, este nível é muito relevante para a evolução do índice, já que um possível corte abre as portas para uma evolução até ao nível psicológico dos 6.000 pontos. "Mas convém realçar que numa análise de médio, e em especial de longo prazo, este movimento terá um impacto muito reduzido, já que uma inversão definitiva do sentimento apenas acontecerá com o corte do nível psicológico dos 7.000 pontos. Assim e apesar do meu optimismo, os investidores devem-se manter atentos e cautelosos", afirma Alexandre Sousa.
As cinco acções mais recomendadas na Europa
Vinci SA
No índice que agrega as 50 maiores empresas europeias, o Eurostoxx, a empresa francesa do sector da construção é aquela que reúne um maior consenso de recomendações positivas junto dos analistas, com uma pontuação de 4,5 (de 0 a 5), no ‘score' elaborado pela Bloomberg. A acção está a subir 11% desde o início do ano, mas apesar disso é uma das empresas do índice que apresenta um dos potenciais de valorização mais elevados: 23% face aos preços de quarta-feira.
Compagnie de Saint-Gobain
A empresa francesa nasceu em 1665 para criar os espelhos do Palácio de Versalhes a mando do rei Luís XIV. Hoje é a referência mundial na produção de produtos em vidro, cerâmicas e plásticos. Os analistas gostam dela: em 32 recomendações, 24 são de comprar. O que corresponde a um ‘score' de 4,43 segundo a Bloomberg. A empresa já valorizou 17% este ano mas as casas de investimento acreditam que os títulos podem subir mais 16%, face aos níveis de quarta-feira.
Volkswagen
Apesar da crise que afecta a compra de bens duradouros como os automóveis, as casas de investimento estão confiantes para o título. Em 39 recomendações, 28 são de "comprar". Em 2011, e segundo um ‘research' do Shinhan Investment, as vendas de carros encolheram 1,4% na Europa. No entanto, na Alemanha a tendência foi diferente, com o mercado alemão a registar um crescimento de 8,8%. E a Volkswagen destacou-se: conseguiu aumentar as suas vendas em 7,8% na Europa. A empresa valoriza 21% desde o início do ano.
Repsol
A petrolífera é a única empresa espanhola a figurar no ‘ranking' das acções europeias preferidas dos analistas. Nas últimas semanas, foi tornado público que a filial da Repsol na Argentina reviu em alta as estimativas das reservas no campo de Vaca Muerta, um facto que levou algumas casas de investimento a reverem em alta a avaliação do título. Das 10 acções seleccionadas neste cabaz, a Repsol é aquela que apresenta um potencial de valorização mais elevado: 30%.
Louis Vuitton (LVMH)
O gigante líder mundial da indústria do luxo parece incólume à crise. A Moet Hennessy Louis Vuitton apresentou no ano passado um crescimento recorde de 16% das receitas, que atingiram os 23,7 mil milhões de euros. Os analistas do Deutsche Bank dizem que, embora a acção esteja a negociar com um pequeno prémio em relação a outros títulos do sector, a LVMH tem qualidades defensivas superiores. E não são apenas os analistas do DB que nutrem uma preferência por este título. Segundo a Bloomberg, apenas um dos 30 analistas que acompanham o título recomenda a venda do mesmo.
As cinco acções mais recomendadas nos EUA
JP Morgan
O sector financeiro tem sido o mais fustigado pela crise e o "mais repudiado" pelos investidores e analistas. Mas nem todos os bancos são mal-amados. É o caso do JPMorgan. Esta é a empresa com o ‘score' mais elevado de recomendações positivas por parte da Bloomberg: 4,78. Trocado em números significa que, em 37 recomendações, 33 são de "comprar". Em 2011, e apesar de um mau quarto trimestre, o banco registou um lucro líquido recorde 18,9 mil milhões de dólares: mais 9% do que no ano anterior.
United Technologies
A empresa tecnológica que fornece produtos e serviços para a indústria aeroespacial e para o sector da construção é também um dos títulos favoritos dos analistas. Em 24 recomendações, 20 são de "comprar". O facto de o título ter já subido cerca de 13% este ano retira algum potencial de valorização à acção. Segundo a média dos preços-alvo apontada pelos analistas da Bloomberg, a acção poderá subir apenas mais 7%. No último trimestre do ano passado, as vendas da empresa subiram 11% com a procura de serviços para a produção da Boeing e da Airbus.
Coca-Cola
Para muitas pessoas, a Coca-Cola é a melhor e a mais refrescante bebida do mundo. Para muitos analistas também. As acções da Coca-Cola são seguidas por 23 analistas em todo o mundo. Destes, 19 recomendam a compra do título. Os analistas do Deustche Bank dizem que a elevada volatilidade do mercado cambial e das ‘commodities' vai afectar os resultados deste ano. No entanto, também dizem que as acções da Coca-Cola "são uma forma segura de apostar na recuperação económica dos EUA e na melhoria do rendimento ‘per capita' e do PIB nos mercados desenvolvidos".
Caterpillar
A Caterpillar é a referência mundial na concepção e produção de equipamentos e máquinas para os sectores da construção, minas, agricultura e floresta. A empresa americana, que já subiu 25% só este ano, é uma das eleitas dos analistas. Em Janeiro, a empresa divulgou resultados anuais recorde: os lucros dispararam 83% face a 2010 e as vendas e receitas registaram o maior crescimento desde 1947. Os números surpreenderam os analistas, obrigando as casas de investimento a reverem em alta as suas avaliações.
Boeing
A encerrar o ‘ranking' das acções americanas preferidas dos analistas está a Boeing. A empresa que produz aviões comerciais e que desenvolve sistemas para o sector da defesa tem um ‘score' de recomendações positivas de 4,4 segundo os dados da Bloomberg. Em 31 recomendações, 23 são de "comprar". Segundo a média dos preços-alvo apontada pelos analistas, a acção tem um ‘upside' de 13%, face aos níveis de quarta-feira. Ainda esta semana, a empresa anunciou ter fechado um negócio de 22,4 mil milhões de dólares com a companhia indonésia Lion Air, que encomendou 230 aviões à Boeing.
fonte:http://economico.sapo.pt/